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quarta-feira, 1 de abril de 2009

Drácula de Bram Stocker. Mais que terror, amor.


O logotipo da Columbia, nos permite escutar os primeiros acordes de uma marcha macabra, que logo dá seguimento a um prólogo. Parece uma lição de Historia, que nos remete à Constantinopla do século XV, quando sofreu a invasão dos turcos.
Pensamos que veremos uma história de terror. É isso que pensamos assistir em Drácula de Bram Stocker. No entanto, os românticos de plantão tem uma grata surpresa no decorrer do filme. Apesar de se tratar de uma história com vampiros, o filme, na verdade, trata-se de uma história de amor. Um amor que perdura mesmo na maldade. Um amor que atravessa os séculos e continua intenso. Um amor que vive além da morte.

O prólogo do filme narra a historia de como o nobre e cruel aristocrata romeno tornou-se Drácula, o vampiro: foi por amor a uma mulher, Elizabetha. A princesa que se suicida porque pensa que seu príncipe morreu. O príncipe, ao ver a esposa morta torna-se um ser diabólico, imortal, que atravessa os séculos até encontrar a reencarnação de sua amada.

No filme, os acontecimentos se passam no tempo presente, o que aumenta a ação das cenas. E podemos dividi-lo em três partes além do prólogo. A primeira que mostra o conde envelhecido, uma figura excêntrica, e que termina na hora em que o conde viaja e chega em Londres. A segunda parte até que descobrem sua verdadeira identidade e, por fim, a terceira que vai até a cena onde lhe cortam o pescoço e ele recebe o perdão do Deus renegado por ele.

Ainda no prólogo é possível percebermos técnicas do cinema de animação. Na batalha e durante a segunda parte do filme, a fotografia de Michael Ballhaus, trabalha com as sombras trazendo recursos do teatro chinês e da lanterna mágica, precursores do cinema . Podemos até mesmo ver presente numa cena do filme, quando o Conde Vlad chega em Londres, o próprio cinematógrafo e a maneira como ele era passado. A invenção recente era considerada produto de baixa cultura, como a personagem Mina deixa claro ao mandar o conde procurar cultura em museus e teatros.

Em diversas cenas, a sombra de Drácula torna-se um personagem independente, em especial na seqüência em que Keanu Reeves anuncia ao conde que é o noivo de Mina. A sombra que se move de modo diferente do dono acentua o caráter do vampiro e dá mais suspense à cena. É uma referencia clara ao teatro que trabalhava com sombras de pessoas e objetos para criar a ilusão da projeção de uma cena.

Apesar da história de amor cental, sequências de sensualidade extrema dão ao filme cenas memoráveis. Como as cenas onde Jonathan Harker (Keanu Reevers) sai do seu quarto, à noite, para conhecer o castelo e encontra três vampiras que, literalmente, o devoram. Num exercício cinematográfico de sensualidade e sexualidade, uma delas abre as calças do Jonathan e, ao levantar a cabeça, mostra os dentes pontudos de vampira e desce a cabeça, rápido... um corte no rosto dele, que se levanta, entre desespero, dor e prazer!

Até mesmo as cenas protagonizadas pelas amigas Mina (Wynona Rider) e Lucy (Sadie Frost) primam pelo erotismo presente. Mina se entrega ao vampiro por sua própria vontade, querendo ser como ele. Lucy com seu cabelo vermelho, é a personificação do sexo em uma personagem. Ela fala frases picantes, quer se entregar a todos de uma só vez, e as cenas nas quais ela é atacada pelo vampiro chegam próximas ao cinema erótico, pelos gemidos que se ouve e pelas estranhas posições em que o vampiro suga-lhe o sangue em uma pesada cena de sexo com um Drácula transformado em animal.

Gary Oldman, por sua vez, surpreende com a interpretação de uma personagem multifacetada: primeiro, um guerreiro medieval em um momento de fúria, em seguida, um velho conde excêntrico que acolhe de modo sinistro e respeitoso o hóspede inglês Jonathan Harker . Também se transforma em um lobisomen que sodomiza Lucy e em um jovem aristocrata que caminha por Londres, alternando a imagem de um nobre cavalheiro e sua real identidade enquanto vampiro.

O filme sofreu diversas críticas por modificar a história original do livro escrito em 1897 por Bram Stocker. Entretanto, recebeu diversos elogios quanto às técnicas utilizadas. Efeitos simples de animação, velas que acendem, fumaças que se movem e olhos que tudo vêem no meio do céu deram ao filme a sensação de nostalgia resgatada dos primórdios do cinema. as, sem dúvida o melhor deste filme está em seu cenário. Já desde o começo, nos damos conta de que não assistimos a uma trama convencional, senão quase um montagem teatral. cada cenário é apresentado de um ponto de vista frontal com planosgerais para poder cnhecer todos os detalhes.

Como motivo complementar, devo mencionar a importância da cor como valor simbólico. Neste sentido, o vermelho é uma das mais repetidas, em alguns casos evoca o caráter de morte, mas também o amor. Romântico como pode ser o vestido em Mina, ou luxurioso como no tom de cabelo de Lucy e na cor da camisola transparente, vista no encontro dela com o lobisomem.
Vermelho é também a armadura, que o príncipe Drakul usou no prólogo, símbolo do valor do guerreiro, e carmesim é o vestido quando se revela a Harker como um ancião. Além disso, vermelho é o símbolo da vida, "O sangue é vida", repete com insistência o vampiro ainda que seja uma vida maldita, de condenação eterna.
Outra das cores empregadas é o branco, tradicionalmente considerado um símbolo de pureza e bondade. Neste caso branco é o vestido de noiva com que vestem Lucy em sua cripta, convertendo-se em um improvisado uniforme do novo vampiro. O branco tem assim um caráter de morte, não de vida. A mesma cor veste o conde quando Mina decide abandoná-lo para voltar aos braços de Harker, o que desperta a ira do vampiro, precipitando os acontecimentos.
Também um símbolo de morte pode considerar-se o verde do vestido da princesa Elizabetha, ou em outro caso uma forma com de reconhecer o amor perdido, como o vestido verde azulado que Mina usa quando o conde a aborda nas ruas de Londres. Assim como as cores tem importância, também tem as sombras, utilizadas para representar momentos de grande crueldade como o massacre da batalha inicial, ou as sombras que habitam o castelo de Drácula, com especial relevância a sombra do conde que parece ter personalidade própria.

Tampouco deve esquecer-se o figurino, obra da japonesa Eiko Ishioka, destacando o caráoter exótico da indumentaria das noivas de Drácula, a riqueza das túnicas que usam alguns dos personagens, como por exemplo a que usa Drácula quando sai de seu caixão, a armadura do príncipe cuja aparência é similar a textura dos músculos, o que lhe dá a espécie de segunda pele; sem esquecer o impressionante vestido nupcial de exuberante e exótico colo. A música é outro dos pontos importantes, seu autor Woiciech Kilar, foi capaz de intercalar temas românticos como o que corresponde a relacão de Mina-Drácula, com motivos mais intensos que sobressaem aos ataques do vampiro e que em alguns casos aparecem ressaltados por uma inquietante voz feminina.
A todo o filme se deve dizer que é excelente “A love song for a vampire”, composta e interpretada por Annie Lenox que se pode escutar nos créditos finais. Em definitivo, “Drácula de Bram Stoker”, supôs uma aproximação da figura dos vampiros, onde a natureza animal destas criaturas convive com um romanticismo latente, presente na excelente historia de amor, que subjaz como tema central do filme. Uma proposta arriscada, mas de grande beleza visual, que vale a pena ser vista mais de una vez para poder captá-la em toda sua plenitude.

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